CUIDADO: FRÁGIL!
CUIDADO: FRÁGIL! -
algumas observações após assistir o espetáculo
Autor: Criação Coletiva | Diretor: Mauro Júnior | Elenco:
Alex Zanonn, Athos Reis, Elton Monteiro, Marcus Labatti, Sidneia Simões, Simone
Caldas | Produtor: Alexandre Toledo / Cia da Farsa | Iluminador: Mauro Júnior |
Blog: www.companhiadafarsa.blogspot.com |
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Entrar num ambiente onírico é
definitivamente saber que a prosa não será suficiente para descrever o que está
por vir. É preciso pensar, ver e sentir em forma de poesia. Essa foi a minha
primeira impressão ao adentrar no universo de cuidado-frágil. Uma grande
Mandala delimitando direções, por onde os personagens se deslocam em sentidos
cartezianamente demarcados, infundindo o corpo, texto e visual numa única ação.
Cada personagem carrega sua bagagem, em mochilas vermelhas, sob o texto que
mostra a dúvida fundamental: será o super-homem totalmente de aço ou por baixo
de sua fortaleza intransponível corporal reside algo de frágil, por
conseqüência, algo de humano.
Histórias
de sobreviventes, náufragos na vida. É a impressão que coube, quando vi aquelas pessoas lançadas em suas
vidas, em suas próprias experiências,
como náufragos em ilhas totalmente isoladas do resto do mundo tentando
sobreviver. Uma ilha cercada por um oceano invisível, um oceano de distâncias
do contato verdadeiro com o outro. Assim como o super-homem tem sua fortaleza
da solidão imersa no gelo, cada um ali nessa história constrói o seu
isolamento, seja ele de ordem fisiológica, social ou emocional.
Metáforas
é que não faltam neste espetáculo e seria um sacrilégio colocar neste texto
todas minha descrições, todos os detalhes de minhas observações, porque
contaminaria e retiraria do leitor a chance da experiência imediata ao assistir
a peça. A mulher é presa dentro de um armário, mas sua prisão torna-se seu
lugar de poder. O mesmo pano que amarra os pés é o que liberta-se na dança, as
tiras que aprisionam a marionete também a sustentam, o surdo/mudo produz som
para não ser escutado, a chuva que isola também afasta o que não quer, os
mesmos que enxotam o mendigo-cachorro, são os que dão as migalhas. “O cachorro
se acostuma com as migalhas e eu me acostumei com os restos de vida”.
São explicitadas aos poucos as
suas fragilidades e é bem claro que para além de suas fortalezas eles não podem
existir. Sua fragilidade é a sua força. Essa é a diferença entre o homem e o
super-homem. O que faz a força do super-homem é o sol amarelo. Quando um dos
personagens recebe a luz do sol matinal, que dá tudo ao super-homem, para o
homem comum é quando ele pode mostrar toda sua fragilidade e então ele se
despe, ele se torna ele mesmo.
O vermelho em quase todas
culturas está vinculado à paixão, ao desejo
Cada um carrega sua bagagem de paixão, sua mochila vermelha e estas
mesmas mochilas se tornam suas capas que os permitem voar rumo aos céus, ao som
da melodia inaudível da guitarra. O guitarrista não pode escutar o som, apenas
as vibrações que são emitidas para dentro. Penso que deveria ser assim mesmo
com todos, não escutar só as palavras, mas também as impressões, vibrações e
efeitos que produzem diretamente dentro de nós. Esta vibração dentro, esta
paixão seria o ponto que torna o homem, humano. É compreender que para viver a
paixão, lê-se paixão como tudo aquilo que move o homem de dentro pra fora, seus
anseios, desejos, angústias, medos, prazeres, é preciso assumir a sua
fragilidade perante a vida que as vezes é intransponível e dura.
Tornar-se humano é entrar em
contato com a própria condição humana. Ao aceitar a condição humana, fatídica,
em que somos lançados nestas ilhas de mundo ou neste mundo de ilhas, tal
condição caracteriza-se como sua, e então, este é o momento que se pode
escolher a transposição ou a sustentação desta mesma condição, mas agora como
algo próprio, apropriado, como uma escolha. A condição humana é de fragilidade
e força.
Lembrei-me do pensamento de
Sartre “O que vou fazer com que a vida fez de mim?”
É neste mundo que fui lançado
durante o espetáculo.
Fabio Teixeira
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