Zucco



ZUCCO -  Algumas observações sobre o espetáculo.


Baseado no texto Roberto Zucco de Bernard-Marie Koltès, com encenação e dramaturgias criadas a partir de processo compartilhado.


FICHA TÉCNICA
CRIADORES: Amaury Borges, Assis Benevenuto, Dulce Beltrão, Elba Rocha, Admar Fernandes, DJ Black Josie, Camila Morena, Helvécio Izabel, Luciana Gomes, Felipe Cosse, Juliano Coelho, Vinicius Simões, Benjamim Abras, Luciana Veloso, Linete Matias, Allan Calisto, Claúdio Galalau, Jessica Tamietti, Andréia Gomes, Jessica Azevedo, Thiago Fernandes, Túlio Sieiro, Rafael Massotti, Lucas Alberto, José Maria, Mateus Andreata.
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Os Pássaros e suas gaiolas abertas.


Não há pessoas livres, não existe liberdade. Zucco deveria estar atrás das grades, é um assassino. Mas para todos ali existiam gaiolas invisíveis. Presos em suas famílias, em seus valores, em suas virgindades. Acorrentados em seus medos, em sua vaidade, em suas pretensões e vícios. Enjaulados em seus sonhos,  ilusões e desejos. A liberdade é utópica e o próprio desejo de liberdade amordaça a serenidade. O pássaro que se sai da gaiola, ao invés de fugir, leva o público para dentro da prisão. A cada escolha e acontecimento, amarram-se mais às suas próprias sendas e atracam-se com aqueles que cruzam destinos. As escolhas de cada um modificam seriamente de forma visível ou imperceptível a vida de todos. Por isso não há liberdade, cada personagem tem seu destino emaranhado com o destino do outro e com as condições em que existe. A vida é uma grande gaiola com portas abertas, mas nós nunca saímos, somos pássaros sendo empalhados numa grande gaiola pendurada num canto do universo. Uma taxidermia da alma.


Foi uma experiência intrigante assistir Zucco. Senti-me a princípio entrando numa versão moderna do Dr. Parnassus.  Um cenário que levou meus olhos a passear por todas as partes possíveis do teatro, com riqueza de detalhes em cada canto, numa proposta de transformar todo o espaço possível daquele ambiente em parte do espetáculo. Um ambiente que beirava o surreal.


A primeira coisa que me deixou satisfeito foi essa quebra. O espetáculo não acontecia somente à frente dos olhos, mas ao redor. Teto, chão, paredes, embaixo das escadas, buracos, janelas, todas as direções foram tomadas, ocupadas, utilizadas por imagens, pinturas, objetos e pelos personagens. Tive de ficar atento porque a qualquer momento e em qualquer lugar poderia começar uma nova ação.


Cada cena parecia-me como um novo espetáculo, diferente e isolado do anterior. Algumas iniciavam de forma apoteótica, outras de forma tensa, mas cada uma com uma narrativa e estética bem peculiar, enquanto moldavam numa colcha de retalhos de cenas isoladas a dramaturgia proposta.


Como um grande circo mágico, vi os corpos dos artistas se movimentarem com presteza. Técnicas circenses, manipulação de objetos, fogo, água, cores cheiros. Habilidades de escalada, quedas e rolamentos ao estilo do Parkour.


Os corpos ali presentes tinham algo de peculiar, algo de vivo e verdadeiro, explorando potencialidades de movimentação e construção de cenas visualmente belas. Esse detalhe conquistou um lugar especial, porque em tudo que acontecia em cena, havia uma preocupação em ser belo, em ter uma fotografia, em construir uma imagem muito marcante. Mal terminava uma cena e uma certa ansiedade já me tomava conta, perguntando-me o que viria de novo agora e de onde?


É uma obra de impacto visual.


Acho que Zucco utiliza propostas que procuram sair um pouco das gaiolas. Acredito que na arte não haja tanta separação entre o que é certo ou errado, belo ou feio. Arte é arte. É difícil construir novas estéticas sem se deparar com a barreira do medo do novo. A idéia do que é belo, bom e proveitoso é condicionada aos sentidos estéticos vigentes e sempre representam apenas parcelas da verdade,  já que a estética muda com o tempo.


O teatro talvez retire o lugar utópico da liberdade, permitindo certos vôos para além. Mas não é fácil sair pelas portas abertas.




Fabio Teixeira




Fabiozen.blogspot.com




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