O Fio do Casulo
O Fio do casulo
(Fabio Teixeira)
(Fabio Teixeira)
Há algo alvoroçado e incomodado dentro de um espaço totalmente
inesgotável de possibilidades que se tornou a própria prisão horrorosa
de uma alma que tem medo. Ninguém merece passar pelo recolhimento que me
pertence. Todas essas coisas que sinto não são de outras pessoas, que
tem suas próprias vidas, suas próprias expectativas e frustrações. Não
desejo a ninguém esta náusea, este receio absurdo pelo próximo segundo
inevitavelmente tedioso. Tudo que sinto está demasiado intenso, mas sei
que é devido à intensidade do que há dentro de mim. O sofrimento tem
esse valor tão desvalorizado. Uma dor serve para mostrar a capacidade de
se sentir certas coisas. Não que isso seja bom, mas já é algo
decididamente maior se comparado à não sentir nada. É uma discrepância
invisível aos outros, entre o que há dentro e o que acontece fora, uma
imaturidade da ação propriamente dita. Não sei bem quando me tornei uma
pessoa triste. Simplesmente aconteceu e quando notei meus dentes já
estavam amarelos e esses músculos que levantam os lábios já se sentiam
esgotados, às vezes até trêmulos pelo esforço de mentir publicamente
abaixo de pálpebras que mais parecem persianas em meia sombra. É como
uma fome de algo que não sei como saciar. Coloco e coloco coisa goela
abaixo e o poço é tão fundo e obscuro à minha percepção que sequer
escuto a vida mastigada fazer barulho ao chegar no fundo. Não há fundo,
um limite visível ou sensível para o que sinto. No entanto, fora do poço
que sou, todos podem vislumbrar a orla florida, o jardim de repouso
para idéias esgotadas que olham para o horizonte enquanto o sol se põe
ou nasce, porque para mim é praticamente a mesma coisa. Muda a direção
do astro, mas tudo não passa desse jogo de pique-esconde de luz e
sombra. Um jogo pérfido do tempo para reinventar sentidos para uma
existência inacabada. Esta é a derradeira solidão. Esta certeza absoluta
que ninguém faz idéia da profundidade plena de vazio que sou. Achei um
tanto absurdo quando escrevi essa ultima afirmativa, mas, e daí? Não sou
mais o desejante das certezas prescritas pela felicidade, pela
aceitação de um olhar. O mesmo olhar que almejo e repudio
constantemente, tornando improfícua essa tentativa de aproximação de
alguém. É uma barreira invisível, mas palpável que me afasta do contato.
Já descobri que a pele não pode ser meu limite absoluto. Eu sei que
além dessa membrana orgânica não existo fisicamente, mas por vezes meus
limites são muito maiores do que o meu corpo pode suportar. Essa pele
não estica o suficiente, meus músculos são encurtados demais pra
extensão do que sou. E isso dói, porque nunca chego lá, nunca chego onde
eu iria sem meus limites fatídicos de um humano comum que não quero em
absoluto aceitar. Mas também não me nego a apreciação da realidade. Não
sou tolo demais, nem louco demais para não constatar minha
insignificância limitadora. O que me incomoda é esse movimento pendular
de minha consciência que irritantemente não sai de um balanço monótono
dentro dos padrões da normalidade. Estou falando o tempo todo de um
desejo ardente pela mudança. Mesmo que seja para a desgraça total e a
aniquilação, porque não? A estagnação sugere a morte parada na poça
entre as rochas, onde nem o vestígio suave de uma brisa causa movimento.
Assim, nem as larvas do mosquito crescem nessa água. E como demora pra
evaporar a água parada longe do sol. Acho que é isso que desejo, que o
meu próprio sol faça nuvens desta inércia. Nuvens que pertençam à lugar
nenhum, que sejam frutos da imaginação dos que nelas traçam figuras
estóicas. Afinal, há algo alvoroçado e incomodado dentro de um espaço
totalmente inesgotável de possibilidades que se tornou a própria prisão
horrorosa de uma alma que tem medo. E infelizmente, existe uma
discrepância invisível aos outros, entre o que há dentro e o que
acontece fora, uma imaturidade da ação propriamente dita.
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