Nova Lima On Broadway



De que é feito o sucesso, a vitória? Como termos certeza de que alcançamos o objetivo?


Esta semana eu resgatei este tema que é muito abordado no livro “A Arte Cavalheiresca do Arqueiro Zen”, que transcreverei aqui com minhas próprias palavras:  O mestre, ao perceber a frustração do aluno que não consegue sequer puxa a corda do arco japonês após dois meses de exaustivas tentativas, faz uma demonstração. Pega o arco, que de tão grande, tem de ser sustentado ao lado do corpo, com o braço esticado, enquanto a outra mão puxa a corda, grossa e resistente até próximo ao nariz e os olhos fixam o objetivo. O mestre respira e puxa a corda como se fosse um fio de algodão, observa por um breve instante o alvo e solta a flecha. Vira-se de costas e vai embora. O aluno, desesperado, grita, mestre vamos ver se você acertou o alvo. O mestre então lhe dá a proveitosa lição. Isso não importa. Não importa se eu acertei ou não, o que importa é que coloquei toda a minha atenção e vontade em respirar, puxar a corda, posicionar a flecha na direção que achei correta. Depois da flecha lançada, do ar exalado, nada mais importa. Não posso controlar o resultado de meus atos depois de executados.


Após este prelúdio, conto que hoje assisti o musical “Nova Lima On Broadway”. Eu nunca deixarei de me sentir satisfeito ao ver um teatro cheio. Num mundo cada vez mais marcado pela imbecilidade televisiva, ver um teatro lotado domingo é um sinal que existe ainda formas de fomentar a cultura. E nada melhor do que um Musical, para transpor todos os elementos teatrais ao mesmo tempo, Cena, dança e musica. Tudo junto no palco.


O maior pecado deste espetáculo foi a falha técnica do áudio. Eu diria que por pouco não estragou o espetáculo. Alguns microfones não funcionaram e literalmente acabaram com algumas cenas. A técnica não fez jus ao trabalho dos atores, que se esforçavam para não deixar a cena cair. Alguns infelizmente e talvez por inexperiência ficaram com caras de assustados e desanimados, com os olhares caídos e perderam a energia corporal totalmente.


Achei o cenário e a iluminação muito bacanas, algumas cenas formaram uma fotografia muito bonita de se ver, como por exemplo, na cena de Hair – Aquarius.  Eliseth Gomes realmente é excelente cantora e segurou a cena mesmo com as dificuldades técnicas.


Apreciei as cenas de Cabaret e Popular, protagonizadas por Melânya Fiaux e Louyse Stella respectivamente, onde conseguiram trazer com mais clareza para o palco a linguagem de um musical, com habilidade corporal e coreográfica, interpretação,  energia e voz muito agradáveis e divertidas. Particularmente, afirmo que fiquei impressionado com o trabalho das duas.


Escutei em bastidores e do próprio ator no palco durante os agradecimentos que tiveram pouco tempo para preparar, dirigir e produzir este espetáculo e que não eram dançarinos ou cantores. Nada serve de justificativa, porque o público não tem nada a ver com suas dificuldades. Se o ator se propõe a fazer um trabalho, tem de fazer o melhor possível sem desculpas.


E foi isso que mais gostei de verdade. De colocar a cara à mostra. De ter coragem. Acho que foi isso que fizeram. O melhor possível, movimentaram as pessoas, criaram cena, luz, se prepararam e independente de tudo, estavam lá no palco, movimentando a vida cultural da cidade. Fizeram algo que nunca foi feito em Nova Lima. E isso é muito importante.


Voltando ao arqueiro zen, acho que de certa forma os atores estavam a muitos passos à frente daquele aluno da história. Eles puxaram a corda, respiraram, olharam o alvo e atiraram suas flechas. Desapeguem-se do resultado.


Como budista sempre penso que o foco deve ser no agora e adiante e então, fica o questionamento: Quando vão reapresentar? Já marcaram os próximos ensaios, projetos?


Valeu a pena ter ido a Nova Lima neste domingo, por causa disso. Pra ver gente criando arte, gente arriscando, arriscando-se. Gente com coragem, alguns com talentos evidentes e outros com talentos ainda em formação.


Acredito que os que estão começando a vida artística precisam escutar elogios e também críticas. Eu elogio com todo o meu coração por terem conseguido lançar as flechas, fazer o teatro acontecer. Mas precisam ainda aprender as técnicas de manejo do arco.


Não podem sucumbir aos elogios de amigos e familiares, que são sempre bonzinhos em suas observações e precisam focar em aprimorar as habilidades necessárias para um espetáculo ter ares profissionais.


Merecemos a chance de acertar, de errar e de fazer. Teatro é feito de ação. E toda ação perde o controle após ser executada.


Desejo ao atores de Nova Lima muito sucesso.


Comentários

Leo Gualberto disse…
Obrigado Fábio!!!
Você fez ótima crítica do espetáculo, é disso que precisamos pra continuar fazenda arte cada vez melhor.
Abraço
Leo Gualberto

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