Aquarela Brasileira - Grupo Guararás




Se a sanfona chora eu canto, canto de coração,
quando a folia passa, puxando a multidão.
Mão de pegar enxada, dura como uma pedra
quando pega na sanfona é rosa-amarela.
Voz que com gado berra, já criou calo na goela
quando vem cantar folia, vai pintando uma aquarela;
quando vem cantar folia vai pintando um aquarela...

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Lembrei desta música, quando assisti pela terceira vez um espetáculo do Grupo de Pesquisas e Projeções Folclóricas Guararás. 

O palco da apresentação foi um palco conhecido de minha infância, o cine teatro Brasil, onde me orgulho de dizer que assisti filmes como - Os trapalhões nas minas do Rei Salomão e  E.T -  compondo um palco de memórias e familiaridades aos meus olhos atentos.

Nesta perspectiva familiar, o cenário montado pelo grupo era a caracterização de uma simples vila que trouxe este aconchego de algo que aconteceria logo ali no quintal da minha casa ou na praça em frente a casa de meus parentes, vizinhos e amigos. Se ali morasse, estaria com certeza na janela esperando a banda passar, cantando coisas de amor. 

Uma escolha acertada, para colocar a dança folclórica em seu lugar. Ao lado da casa das pessoas, uma dança feitas pelas pessoas, para as pessoas, por pessoas comuns como eu e você.  

Do Maracatu ao frevo, um deleite de alegria expresso em passos vigorosos e sorrisos convincentes. Eu gosto quando as pessoas dançam com tanta facilidade e naturalidade  que tenho a impressão que eu poderia subir ao palco e fazer parte do espetáculo. Claro que poderia pois tais danças são populares, e salvo toda a qualidade performática dos artistas ali presentes, ainda me senti assistindo pessoas comuns dançando. Julgo isso que digo como uma enorme qualidade e evito propositalmente chamá-los de bailarinos, para renomeá-los para artistas. Acho que comentei algo parecido sobre o espetáculo Brasil das Gerais, mas esta forma de dançar é muito marcante pra mim. O que se vê em danças como estas não é apenas uma dança e sim uma expressão cultural presente nas raízes de um povo. Isso move a dança para um ponto além da coreografia, para além da performance e a coloca no lugar da dança dançada por quem vive o sentido que traz.

Foi uma grande sacada retomar os mitos e lendas brasileiras, mitos ricos e valiosos, um tanto apagados pela excessivo massacre midiesco promovido pela magia Holywoodiana, que tem o seu lugar, claro, mas deixa oculta ao grande público a beleza de nossas próprias lendas urbanas. O barba ruiva, mula sem cabeça, Yara, curupira, saci pererê, e tantas outras  magníficas histórias que ficam jogadas em livros do pré-primário como coisa do passado das crianças que moram no interior.

Para variar os figurinos maravilhosos e muito bem elaborados, encheram meus olhos. 

Os atores mediavam os espetáculo com uma dose de humor bem agradável, caracterizaram-se de uma forma que julguei a mais apropriada de todas, como uma grande brincadeira numa festa popular. Homem fazendo vias de mulher, caipira e até defunto, tudo com uma caricatura propositalmente tosca que tornou tudo muito natural e maravilhoso. Ri bastante da interação entre os três atores e da interação com o público e digo mais, estão perdoados por caçoarem da minha careca durante o processo.

Com um final apoteótico e inusitado, que não vou contar aqui nestas linhas, para não estragar a surpresa de quem irá assistir, fecharam com chave de ouro a apresentação.

Mais uma vez o grupo está de parabéns por manterem viva a chama do folclore Brasileiro, saibam o trabalho que fazem é muito mais importante do que vocês podem imaginar, alcança os meandros dos valores esquecidos neste mundo veloz, capitalista e globalizado, homogeneizado por culturas estrangeiras. 

A raiz de nossa cultura precisa ser dançada cada vez mais.

Sigam em frente, sucesso, paz e alegria.

Fabio Teixeira.

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